Mesa do Dia 13 de Novembro de 2025 – Debate sobre a Implementação da Universidade Indígena no VIII FNEEI/COP30



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by : Oziel Ticuna- fotógrafo e videomaker


Por ALANNA S. CARDOSO TUPINAMBÁ (Presidência – IPPCS / FÓRUM PARAWARA)

No dia 13 de novembro, durante a programação oficial do VIII Fórum Nacional de Educação Escolar Indígena (FNEEI) na COP30, ocorreu a mesa temática "Universidade Indígena: histórico da mobilização, fundamentos jurídicos e político-pedagógicos", reunindo lideranças, pesquisadores(as), estudantes e professores(as) indígenas de diferentes regiões do país para debater os rumos da implementação da primeira Universidade Indígena do Brasil.

A mesa foi conduzida por Dioclécio e Rosilândia, que abriram a atividade com saudações e apresentação cultural dos parentes Kaiapó.

Compuseram a mesa:

  • Prof. Dr. Gersen BaniwaCoordenação Executiva do Fórum Nacional de Educação Escolar Indígena (FNEEI); liderança histórica do movimento e integrante dos processos de construção do marco conceitual, das consultas nacionais e da redação do Projeto de Lei da Universidade Indígena;

  • Profa. Dra. Rita PotyguaraCoordenação Executiva do Fórum Nacional de Educação Escolar Indígena (FNEEI); integrante do GT instituído no Governo Dilma (2014) e articuladora nacional pela Universidade Indígena;

  • Isabel Taukane – Presidenta do Instituto Plurinacional de Pesquisadores e Pesquisadoras Indígenas (INPPEI);

  • Arlindo Baré – liderança estudantil indígena com atuação nas pautas de educação e justiça climática;

  • Altacir Kokama – representante do Grupo Nacional da Década das Línguas Indígenas;

  • Profa. Alva Rosa (Tucano)Organização do VIII FNEEI, pesquisadora e referência nacional nos debates sobre heteroidentificação e pertencimento étnico.

1. Panorama Geral do Debate – Universidade Indígena

O Prof. Gersen Baniwa, da Coordenação Executiva do FNEEI, apresentou o histórico da construção da proposta da Universidade Indígena, ressaltando que a iniciativa não é uma proposta de governo, mas sim uma conquista forjada pelo movimento indígena ao longo das últimas décadas. Ele destacou:

  • a mobilização de mais de 22 mil professores indígenas;

  • os 21 seminários de consulta nacional realizados pelo movimento;

  • a elaboração coletiva do marco conceitual e do relatório final;

  • e a redação do Projeto de Lei, escrita pelas próprias lideranças e entregue ao Governo Federal.

A Profa. Rita Potyguara, também da Coordenação Executiva do FNEEI, reforçou que a Universidade Indígena deve ser uma instituição de alta qualidade, articulando conhecimentos tradicionais, tecnologias de ponta e práticas interculturais. Defendeu que a implementação depende da mobilização contínua dos povos indígenas, sobretudo para garantir a aprovação do Projeto de Lei no Congresso Nacional.

Em sua fala, Isabel Taukane destacou a importância da autonomia intelectual indígena e da construção de metodologias próprias, superando a tutela epistêmica e fortalecendo redes de pesquisadores indígenas em todo o país.

Arlindo Baré chamou atenção para a centralidade da educação indígena no combate à crise climática, afirmando que justiça climática e educação caminham juntas e devem ser reconhecidas como eixos estratégicos no contexto da COP30.

Altacir Kokama reforçou a necessidade de políticas linguísticas estruturadas, garantindo acolhimento, acesso e permanência por meio das línguas indígenas — orais, escritas e de sinais.

2. Pertencimento Étnico, Memória e Documento Narrativo – Contribuição da Profa. Alva Rosa (Tucano)

A Profa. Alva Rosa (Tucano) apresentou uma reflexão decisiva para a mesa e para a plenária: a urgência de consolidar critérios legítimos de pertencimento étnico, definidos pelas próprias famílias, coletivos e organizações indígenas.

Ela ressaltou que o reconhecimento indígena não pode se limitar à autodeclaração ou a processos burocráticos desconectados da vida comunitária. O pertencimento é um vínculo histórico, coletivo e ancestral, sustentado pelas memórias familiares, pelas tradições vivas, pelas trajetórias de deslocamento e pelos laços territoriais e espirituais de cada povo.

Sua fala tornou-se um dos momentos de maior profundidade política do dia, expressa na seguinte afirmação:

"Pra gente não ter apenas a autodeclaração com as assinaturas, mas ter esse documento também narrativo, né? Pra pessoa saber se ela está com isso."

A partir dessa reflexão, Alva defendeu a institucionalização do Documento Narrativo de Pertencimento Étnico, no qual cada pessoa registra sua origem familiar, território de referência, história de deslocamento, vínculos comunitários e continuidade de sua identidade. Este documento, validado pelas lideranças e entidades indígenas, é essencial para:

  • impedir fraudes e apropriações indevidas das políticas afirmativas;

  • fortalecer o reconhecimento comunitário e a proteção dos direitos;

  • e garantir legitimidade nas etapas de ingresso e permanência na futura Universidade Indígena.

A contribuição da Profa. Alva Rosa — ao enfatizar memória, família, tradição e o documento narrativo — tornou-se um dos eixos centrais do encerramento da plenária, aprofundado ao longo da tarde no Auditório Paulo Freire, na presença do coordenador executivo do FNEEI, Prof. Dr. Gersen Baniwa.

3. Síntese Final – Caminhos para a Universidade Indígena

O debate do dia 13/11 apontou caminhos firmes para a consolidação de uma Universidade Indígena que respeite, honre e proteja as histórias, as memórias e os direitos dos povos indígenas do Brasil e da Amazônia, em toda a sua diversidade — das aldeias, comunidades ribeirinhas e territórios florestais às populações indígenas que vivem nas cidades.

Conforme ressaltaram Gersen Baniwa e Rita Potyguara, a Universidade Indígena deve nascer:

  • com docentes indígenas altamente qualificados,

  • capazes de atuar com excelência tanto nas oralidades quanto nas escritas,

  • articulando a dupla perspectiva de conhecimento: o tradicional e o tecnológico. No entendimento do verdadeiro significado da popularização de ciências.

A Profa. Rita Potyguara reforçou que essa instituição deve ser um espaço verdadeiramente acolhedor, inclusivo e protetivo, garantindo a saúde física, emocional, espiritual e mental de estudantes e docentes indígenas. Diferente das universidades convencionais — frequentemente marcadas por racismo institucional, violências simbólicas, adoecimentos e práticas abusivas — a Universidade Indígena deve assegurar um ambiente que fortalece e possibilita que estudantes indígenas e docentes indígenas vivam sua identidade com plenitude, dignidade e saúde integral, em um ecossistema que respeita e protege suas memórias, tradições, línguas e modos próprios de existir.

Assim, o debate conclui que a Universidade Indígena deve:

  • fortalecer a autonomia intelectual indígena;

  • consolidar políticas linguísticas robustas;

  • instituir espaços de cuidado e pertencimento;

  • Fortalecer os territórios e os sujeitos indígenas nos espaços de poder que venham ocupar. 

  • E se tornar um projeto de futuro, guiado pelos conhecimentos, epistemologias e cosmologias dos povos indígenas da Amazônia e do Brasil.