APRESENTAÇÃO DO PROJETO INSTITUTO CARTOGRAFANDO SABERES NA ASSEMBLEIA REALIZADA NO DIA 25/08/2020 PARA APROVAÇÃO DO PROJETO, ESTATUTO E CORPUS INSTITUCIONAL.

POR ALANNA SOUTO CARDOSO

"Por isso cuidado meu bemHá perigo na esquinaEles venceram e o sinalEstá fechado pra nósQue somos jovens...Para abraçar seu irmãoE beijar sua menina na rua da memória.É que se fez o seu braço,O seu lábio e a sua voz... "

Belchior adaptado.

Das minhas inspirações, percepções e como foi pensado o projeto instituto Cartografando Saber.

1) O projeto surgiu inicialmente das minhas angustias pessoais, e posteriormente, coletiva, sobretudo, quando eu já estava mobilizada em um outro projeto coletivo que é o selo Nossas vozes ( trata-se de um coletivo de publicação científica e outras narrativas organizado por mulheres do campo negro e dos povos da Amazônia), vivenciando as inviabilizações, os cortes da conjuntura atual referente a realização científica em um campo de estudos que caminha com os agentes sociais historicamente subalternizados, sejam esses, também, pesquisadores acadêmicos ou agentes comunitários que buscam o diálogo e parceria com esse tipo de movimento acadêmico e que, infelizmente, atualmente tem sido bem pontuais esses tipos de ações de pesquisa e projetos sociais dentro da universidade e cada vez mais de pouquíssima acessibilidade em receber novas iniciativas, novos projetos nesses eixos. Ficando toda uma gama pesquisadores, investigadores, educadores de fora, impedidos. "Eles venceram e o sinal está fechado para nós que somos jovens..."

2) Tendo em vista todo esse processo de exclusão que vai afetar, sobretudo, os pesquisadores pretos, os indígenas, os quilombos, os "mestizos", não obstante a mestiçagem no âmbito de uma relação afroindígena na perspectiva do campo da contra mestiçagem afroameríndia e dos ameríndios, em especial, quando se pensa nos ribeirinhos e seus descendentes seja nos rios ou deslocados para as periferias das cidades ou ainda nas coletividades de matriz africana. Logo, tal contexto de exclusão e cortes justifica a escolha do corpus institucional do projeto ser encabeçado por mulheres desse recorte de etnicidade, raça, gênero e classe social. Apesar desse recorte de gênero na gestão, como organização tem a finalidade de atender os territórios tradicionais e periféricos estará totalmente aberta para dialogar com os pesquisadores, profissionais homens desse front étnico-racial os quais poderão participar enquanto colaboradores, aliados e conselheiros, conforme consenso da assembleia.

3) Assim como houve a preocupação, também, de se pensar na questão estrutural para se realizar um projeto que são os recursos e o mínimo de remuneração adequada aos pesquisadores. Isso certamente exige uma reação e organicidade para buscar as fontes de captação de recursos para a nossa associação. Então o projeto surge primeiramente da necessidade de auto inclusão dessas reivindicações sociais e científicas. E que na verdade reflete todo esse processo que já vem sendo colocado na América latina e na África, em especial, com os estudos pós coloniais alinhados em uma investigação não somente científica, mas também política, no sentido mesmo de romper com uma perspectiva de histórica única. E de descolonizar e repensar uma ciência liderada, sobretudo, por grupos hegemônicos, buscando assim fortalecer, reconhecer e qualificar as autoridades científicas dos campos periféricos e dos territórios tradicionais dentro e fora da academia que estão levando adiante seus projetos, buscando alternativas de organização institucional e reivindicando apoio, financiamento.

4) Aí entra necessidade da organização desses intelectuais, investigadores, educadores, lideranças e agentes que estão atuando junto com o movimento acadêmico periférico e assim fazer o front, construir um espaço de produção, de criação, elaboração, qualificação dos profissionais e agentes envolvidos. Além, do retorno social para as comunidades e aos povos da Amazônia.

5) Afinal, os esforços atuais que estamos nesse momento nos organizando é não somente exigir políticas públicas por meio de projetos que ajudem na autonomia desses povos e comunidades junto com o fazer científico e social, mas também a importância das associações e das formas organizativas comunitárias para o fortalecimento dos seus meios de consolidação dos conhecimentos e saberes práticos dos povos indígenas, comunidades tradicionais e grupos periféricos urbanos.

6) Feita que essa primeira introdução das causas e da importância da organização é importante, também, explanar um pouco sobre as linhas de ações, posto que não se trata apenas de projetos científicos, mas também de projetos sociais articulados com diversas esferas da sociedade por meio dos grupos de trabalho que analisem o mapeamento desses territórios tradicionais e/ ou periféricos como uma forma de fortalecer as suas gestões comunitárias e lhes garanta vida; a preservação dos seus recursos hídricos e naturais; os seus direitos territoriais nas práticas de seus saberes e territorialidades em seu tempo e espaço; a manutenção de suas cosmologias ; da sua tradição oral ; línguas e defesa da sua comunicação e educação específica na qualificação dos professores e professoras das próprias comunidades; sejam esses indígenas e/ou quilombolas; assim como a importância da educação popular freireana para as escolas básicas referente as comunidades ribeirinhas, campesina e das periferias da cidade.

8) Nessa direção o instituto começa, a princípio, abrindo com oito linhas de ações:

1) A nova cartografia histórica, terras tradicionais ocupadas e memória oral coletiva

Dra. Alanna Souto

Trata-se de um novo mapeamento do passado referente as práticas espaciais de grupos étnicos, sejam esses indígenas ou quilombolas, dos territórios do passado que atualmente estão abarcados nas chamadas terras tradicionalmente ocupadas em diálogo com a memória oral coletiva, tendo em vista que o território é o elemento essencial em diversos conflitos de terras, e como bem lembra Boaventura Santos, a temporalidade das lutas de indígenas e dos povos quilombolas, a luta pela terra desses povos está ligada ao tempo largo da escravidão, à colonização e todos os esbulhos dos territórios forjados pelos colonizadores, diferente, por exemplo, da temporalidade do movimento sem-terra que é mais vinculado ao momento atual de concentração fundiária.

2 ) Práticas espaciais de saberes tradicionais dos povos e comunidades de matriz africana. Diálogos entre dois mundos- Áfricas, Afro-Amazônia e interculturalidades.

Temos na coordenação dessa linha a profa. Dra. Selma Brito que vai buscar traçar todo esse mapeamento em diálogo com a patrimônio, memória, religião, etnicidade, os processos diaspóricos desses povos e comunidades de matriz africana. Pensando nas Áfricas que aqui chegaram, de forma articulada, com o continente africano, em especial, com as nações que atravessaram para a Amazônia do passado colonial e investigar como elas se recriaram no espaço amazônico. E nesse sentido visando esse intercâmbio entre dois mundos.

Outro ponto é investigar os processos afrodiásporicos na formação dos povos de terreiros, e a organização de um inventário de memórias dessas comunidades no espaço afro amazônico em defesa de seu território, territorialidades em diversos contextos.

3) Ciências e saberes indígenas, mapas das resistências e outras narrativas dos povos indígenas. Pesquisadoras/ membros responsáveis:

Coord. Institucional Dra. Alanna Souto Cardoso.
Tal linha de ação vai se centrar em um mapeamento que tem como base eminentemente a tradição oral das nações indígenas em seus múltiplos aspectos, sobretudo, no maior entendimento das categorias espaço-tempo dos povos indígenas, buscando perceber mesmo como se constrói um outro "regime de historicidade" considerando o tempo-espaço desses povos não pautado no regime de historicidade europeu...

E assim fazer junto com pesquisadores um movimento acadêmico e dos saberes tradicionais abra um novo lugar na canoa do tempo da universidade e possa repensar a diversidade do Tempo/ espaço histórico dos territórios que envolvem os povos da Amazônia dentro do Estado brasileiro , seja no campo da etnografia, arqueologia, demografia histórica, sociologia, para além da gaiola da História ou do tempo curto antropológico.

De todo modo essa linha é mais do que história indígena no que se refere digo na especificidade no âmbito do contextos de suas "nações", mas também, é literatura indígena, é medicina tradicional, cartografia indígena na diversidades de seus grupos, então essa linha ação perpassa mais do que história. É o que estou chamando de mapas de resistência que adentra no tempo da tradição oral que é outro tempo histórico e não linear.

Então esses mapas de resistência perpassa a formação do mundo indígena, a cosmogonia, o espaço vivido, a geografia, a cultura que é delineada por meio da tradição oral que é mais do que oralidade. E um outro aspecto de história oral.

O que nos faz lembrar um pouco do esforço que fez Lévi- Strauss para a construção do livro o Pensamento selvagem, muito embora, sejamos mais descoloniais, pois aqui não tem nenhum francês para decodificar a "ciência do concreto" e as filosofias indígenas, não desmerecendo esse livro de fundamental importância para a compreensão do pensamento de outros povos. Nessa direção a dimensão da luta anti colonial que se está travando é mais do que no campo do discurso, mas na práxis, dentro da percepção científica dos saberes e do lugar de fala dos agentes, narrada pelos próprios agentes.

4) Ciência e saberes quilombolas, territórios ancestrais e desenvolvimento social. Pesquisadora/membro responsável.

É uma outra linha ação que tem como pesquisadora a mestre e quilombola Maria Páscoa, e que, atualmente, está concluindo o doutorado em antropologia, e vem fazer esse trabalho de mapeamento em diversas frentes dos modos de conhecimento locais e científico visando o fortalecimento e desenvolvimento social dessas comunidades na Pan Amazônia.

5) Direitos humanos, povos indígenas e comunidades tradicionais: mapeando territórios de direitos e redes de comunicação.

Pesquisadoras/membros responsáveis:

E para abertura e composiçao da formação da gestão dos direitos humanos e comunicação no âmbito dos povos indígenas e comunidades tradicionais da Amazônia a diretora geral atual, a profa. dra. Alanna Souto Cardoso fará o diálogo e a seletiva.

6) Mapas das periferias entre trilhas sonoras visuais e poéticas de espaços da resistência: artes, cultura e cidadania. Pesquisadora/ agente responsável:

Temos como pesquisadora Kelem Ferro que tem experiência na temática e vai desenvolver esse trabalho de mapeamento coletivo e de empoderamento dos espaço culturais e protagonismo periférico no campo das arte, cultura e cidadania.

7) Mapeando a filosofia afro-diaspórica, gênero e territórios raciais na Amazônia. Tem como coordenadora responsável: MSc. em filosofia e profa. Lívia Noranha.

Essa linha visa uma investigação verificando o processo de formação e atuação do pensamento afro-diásporico em seus múltiplos contextos repensando o espaço filosófico na Amazônia em diálogo com questão de gênero, a memória histórica ancestral e os territórios raciais. Fazendo esse debate a partir da perspectiva, também, dos corpos étnico-raciais e na práxis construindo um projeto descolonial que faça uma leitura crítica dessa produção filosófica europeia formativa e criando assim um novo lugar para essa filosofio afro-diáspórica em Abya Yala (América Latina), na Amazônia e dentro da universidade.

8) Mapas dos povos tradicionais e vozes da periferia para a Educação: Resultados das linhas de ações científicas e sociais para o Ensino e pesquisa.

Coord. Lília Melo.

A nossa gestora educacional vai ser a Lília Melo que vai buscar direcionar para os grupos práticas e ações para que se possa movimentar esse conhecimento, os resultados e os produtos dos projetos para escolas do ensino básico da periferia em diálogo com essas pesquisas e ações sociais